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News & MediaFlash AlertOs psicotrópicos e o Direito de Regresso

29 de Julho, 2024

O direito de regresso em acidentes de viação quando o condutor do veículo segurado se encontra sob o efeito de substâncias psicotrópicas

 

No dia 15.07.2024, foi publicado na 1.ª série do Diário da República o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) n.º 10/2024, proferido em sede de recurso extraordinário para uniformização de jurisprudência.

Os Senhores Juízes Conselheiros acordaram em estabelecer a seguinte uniformização:

Nos termos do artigo 27.º, n.º 1, alínea c), do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de agosto, para que seja reconhecido o direito de regresso à seguradora que satisfez a indemnização ao lesado, terá a mesma de alegar e provar que o condutor conduzia sob influência de substâncias psicotrópicas, diminuindo a aptidão física e mental do condutor para exercer a atividade da condução em condições de segurança, devendo tal “estado de influenciação” ser demonstrado através de exame médico e/ou pericial”.

Esta decisão põe termo a uma controvérsia, quanto a saber se, para efeitos do art. 27.º, n.º 1, alínea c) do DL n.º 291/2007, do exame pericial em amostra de sangue deve constar, que o condutor conduzia, no caso em apreço, sob o efeito de substâncias psicotrópicas que influenciavam negativamente a sua capacidade de condução.

Resumindo, confrontam-se assim as seguintes posições:

  1. A do acórdão-fundamento[1], sustentada pelos Senhores Juízes Conselheiros, nos termos da qual o exercício de tal direito depende da demonstração de um estado de influenciação, causal do acidente, que apenas pode ser realizada através da realização de exame médico e/ou pericial.
  2. A do acórdão recorrido, tese oposta, que defende que o direito de regresso pela seguradora com fundamento no consumo de substâncias estupefacientes depende, apenas, da demonstração de que, no momento do acidente, o condutor segurado acusava no exame de sangue a presença de substâncias estupefacientes.

 

Para fundamentarem a posição assumida, os Senhores Juízes Conselheiros invocaram os argumentos que se expõem de forma sintética:

  1. O legislador português não estabeleceu limites mínimos no sangue para as substâncias psicotrópicas, da mesma forma que acontece para a condução sob o efeito de álcool, de onde se possa extrair que o condutor conduzia sob influência daquelas.
  2. Ora, tal indefinição impede a determinação concreta de um limite mínimo, ficando esta dependente da avaliação casuística ou médica, a realizar em cada caso.
  3. Por sua vez, o direito de regresso pressupõe um juízo acerca do risco acrescido de uma determinada conduta imputada ao lesante.
  4. Assim, exige o art. 27.º do DL 291/2007, de 21-08, um efetivo aumento do risco normal associado à circulação de veículos automóveis não contemplado no risco assumido pela seguradora e que foi determinante para a fixação do prémio a suportar pelo segurado.
  5. Quer isto dizer que o direito de regresso apenas deverá abranger os prejuízos que a seguradora suportou e que têm nexo causal com aquelas circunstâncias.
  6. Neste sentido, consideraram os Senhores Juízes Conselheiros que a mera deteção de substâncias psicotrópicas não é suficiente para permitir concluir no sentido da existência de um acréscimo ao risco normal de circulação de veículos, até porque, nem todas as substâncias psicotrópicas presentes no organismo humano implicam alterações na aptidão física e mental do condutor para o exercício do ato da condução.
  7. Ademais, não pode o juiz fazer um juízo valorativo sobre a necessidade de qualquer mínimo relevante para que o condutor possa ser responsabilizado e a seguradora possa exercer o seu direito de regresso.
  8. Consequentemente, é necessário que resulte da realização do exame médico a confirmação de que a presença de qualquer das substâncias psicotrópica foi determinantemente perturbadora da capacidade física, mental ou psicológica do condutor para o exercício da condução de veículo em segurança.

 

Implicações para Segurados e Companhias de Seguros

Esta postura jurisprudencial gera implicações significativas para ambos os lados da relação contratual:

 

Segurados:

  • Maior clareza e previsibilidade acerca dos seus direitos em caso de sinistro.
  • Possibilidade de resistir ao direito de regresso que recai sobre o detentor do seguro, mediante prova inequívoca da ausência de um nexo causal entre a influência da substância e o acidente.

 

Companhias de Seguros:

  • Necessidade de investigação mais aprofundada dos sinistros envolvendo álcool/psicotrópicos, através de elementos concretos que sustentem a influência da substância na condução e no acidente.
  • Maior rigor na análise de provas e na tomada de decisões sobre a exclusão da apólice do seguro.

  

Em suma, para uma companhia de seguros exercer o seu direito de regresso nos termos da alínea c) do n.º 1 do art. 27.º do DL 291/2007, de 21-08 sobre o condutor do seu veículo segurado responsável num acidente de viação, será necessário que faça prova de que se está perante uma condução ilícita pelo condutor se encontrar sob influência de substâncias proibidas e a sua relação causal com o acidente.

 

por Rui de Amorim Mesquita e Ana Rita Villaverde, Área de Prática – Seguros e Responsabilidade Civil

 


[1] Acórdão do STJ datado de 25-03-2021 — Processo: 313/17.2T8AVR.P1.S1 

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