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News & MediaLatest NewsA transferência de sede de sociedades estrangeiras

16 de Junho, 2023

Num mundo globalizado como o de hoje, a mobilidade de pessoas – singulares e coletivas – é cada vez mais uma realidade.

Tratando-se de uma sociedade que pretende transferir a sua sede para outra jurisdição, a legislação de ambos os países – o de origem e o de destino – terá de ser respeitada, impondo-se uma harmonização legal.

A própria definição de sede social é determinada de forma diferente em cada país. Enquanto alguns se baseiam na sua definição como sede administrativateoria da sede, outros poderão associá-la ao local onde a sociedade foi constituída – teoria da constituição.

Transferência de sociedades entre países da União Europeia

De acordo com o direito europeu, a transferência da sede de sociedades está protegida pela liberdade de estabelecimento nos termos do Artigo 49.º do Tratado de Funcionamento da União Europeia (“TFUE”). Nesta base, o Tribunal de Justiça da EU já decidiu (e.g., Acórdão de 05.11.2002 – C.-2008/00, “Überseering” e Acórdão de 30.09.2003 – C.-167/01, “Inspire Art“) que uma sociedade efetivamente constituída num Estado-Membro da UE deve ser reconhecida como tal na sua forma de constituição nos outros Estados-Membros, para que seja possível uma transferência transfronteiriça que preserve a identidade e a forma jurídica.

Contudo, as diferentes formas de sociedade previstas no direito nacional e a ausência de um direito das sociedades harmonizado na UE podem tornar as transferências transfronteiriças particularmente difíceis. A sobreposição de períodos de transferência de sede, associada às diferentes considerações legais de cada país relativas à determinação da lei pessoal e ao conceito de “sede social”, podem mesmo levar a que uma sociedade possa estar registada em duas jurisdições ao mesmo tempo, durante um determinado período. Por outro lado, a possibilidade de transferir a sede social, mesmo dentro da UE, é significativamente limitada se a empresa estiver insolvente ou em liquidação.

As “Sociedades Europeias” (“Societas Europaea”)

Na ausência de uma regulamentação europeia que determine os critérios de transferência de sede de sociedades entre países da EU, e tendo em vista a promoção da mobilidade económica europeia, a possibilidade de transferência de sede social para outro Estado-Membro da UE preservando a identidade da sociedade está expressamente prevista no direito europeu na figura da Sociedade Anónima Europeia, ouSocietas Europaea (SE), plasmada no Artigo 8.º, n.º 1 do Regulamento SE.

Com efeito, a SE é um tipo de sociedade anónima que permite exercer uma única atividade em diferentes países europeus ao abrigo de um único conjunto de regras.

Para se constituir uma SE, devem ser cumpridos determinados requisitos, os quais poderão variar de Estado-Membro para Estado-Membro. Em Portugal, destacam-se os seguintes requisitos (entre outros):

  • A sede social e a administração central devem situar-se no mesmo país da UE.
  • A sociedade deve ter um capital subscrito mínimo de 120.000 euros.
  • Os acionistas terão de ser pessoas coletivas, com ligação a mais de um membro da UE.
  • A denominação da empresa deve obrigatoriamente conter a sigla “SE”.

A transferência da sede social de uma SE para outro país da UE é possível, sem que seja necessário proceder à sua dissolução.

Direito Português

De acordo com o Artigo 3.º do Código das Sociedades Comerciais, as sociedades comerciais têm como lei pessoal a lei do Estado onde se situa a sede principal e efetiva da sua administração, vigorando, portanto, a teoria da sede.

Por outro lado, o mesmo artigo prevê que uma sociedade que transfira a sua sede efetiva para Portugal possa manter a sua personalidade jurídica, se a lei do país de origem o permitir, devendo adequar os seus estatutos à lei portuguesa.

Como funciona na prática a transferência de uma sociedade estrangeira de e para Portugal?

Na prática, a transferência de uma sociedade estrangeira para Portugal equivale a um processo de constituição de sociedade, com a ressalva de que a sociedade em questão pretende transferir a sua sede social para território português, e a apresentação de alguns elementos adicionais relativos à sociedade estrangeira, nomeadamente:

a) Deliberação da sociedade estrangeira que determine a transferência da sede social para Portugal, com tradução para língua portuguesa, certificada e legalizada com a Apostila;
b) Certidão do Registo Comercial da sociedade estrangeira, com tradução para língua portuguesa, certificada e legalizada com a Apostila;
c) Estatutos atualizados da sociedade estrangeira, com tradução para língua portuguesa, certificada e legalizada com a Apostila;

Por outro lado, a transferência de uma sociedade portuguesa para uma outra jurisdição é permitida pelo artigo 3º, nº 4 do Código das Sociedades Comerciais, exigindo a lei que esta transferência seja aprovada com uma maioria de 75% dos votos correspondentes ao capital social.

Conclusão

Em suma, apesar da liberdade de estabelecimento garantida pela legislação da UE, a possibilidade de transferir uma sociedade dentro da UE, mantendo a sua forma jurídica, depende da regulamentação do respetivo Estado-Membro. Em concreto, existem restrições se a forma jurídica da sociedade no país de origem for acompanhada de apertada legislação para a proteção de, por exemplo, acionistas ou parceiros contratuais e não existir uma forma jurídica comparável no país de destino.

A transferência da sede social para outro Estado-Membro da UE é possível sem restrições significativas se a transferência da sede social ocorrer sob a forma jurídica do Estado de destino.

A alternativa mais prática à transferência de sociedades dentro da UE é oferecida pelafigura da SE como sociedade europeia, que já cumpre os requisitos de mobilidade de acordo com a conceção legislativa do direito comunitário. Na ausência de uma Diretiva Europeia que harmonize o direito dos Estados Membros na temática da transferência de sociedades, a SE apresenta-se como uma alternativa prática a contornar os obstáculos impostos pelas diferentes legislações nacionais nesta temática.

 

por Amílcar Silva e Maria Vieira Rodrigues, Área de Prática – Direito Comercial e Societário

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