A evolução do arrendamento urbano em Portugal encontra-se marcada por intensas alterações legislativas incitando a eterna dicotomia entre os interesses do senhorio e do arrendatário, geralmente considerado a parte mais frágil dessa relação.
Os últimos anos têm sido marcados pela criatividade dos sucessivos governos que levam a constantes contradições e alterações legislativas. Atingiu-se um ponto em que, as alterações no sentido de incentivar o investimento e a reabilitação urbana são imediatamente seguidas de novas propostas de congelamento de rendas e dilações automáticas dos prazos de duração do arrendamento. Consequência inevitável é a falta de estabilidade ou segurança neste regime para qualquer interveniente no processo.
Os antigos arrendatários preocupam-se com a volatilidade dos arrendamentos atuais, celebrados com prazos certos curtos e com rendas anualmente atualizadas; ao passo que os potenciais arrendatários protestam a falta de oferta e altos preços do arrendamento; os senhorios, por sua vez, vêem-se forçados a manter com rendas infimamente mais baixas do que as despesas que têm com os locados e sem mecanismos à sua disposição de terminar os contratos celebrados há décadas.
Iniciou-se em 2006 (Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro) um novo capítulo, com a intenção de marcar o passo relativamente a todos os contratos existentes, quando foi publicado o Novo Regime do Arrendamento Urbano que veio trazer a possibilidade aos senhorios de atualização das rendas antigas. Do lado dos arrendatários tal deu azo a ações judiciais, petições, manifestações.
Em 2012 (Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto), o Governo procedeu a alterações ao arrendamento no sentido de impulsionar a reabilitação urbana e oferecer soluções de habitação mais ajustadas às necessidades. Caso desse incentivo ao arrendamento foi a admissão que as partes acordassem livremente o prazo aplicável ao contrato, deixando de estar sujeitos ao prazo mínimo de cinco anos ou a possibilidade de o senhorio converter os contratos celebrados por tempo indeterminado em contratos com prazo certo.
Em 2014 e sequentemente em 2017, retornou-se ao condicionamento da liberdade contratual através do aumento do prazo para renovação automática de contratos de duração limitada celebrados antes do NRAU, para três anos (anteriormente, de dois), do reconhecimento do estatuto de estabelecimentos e entidades de interesse histórico e cultural ou social local ou ainda da prorrogação do período de transição dos contratos antigos para o NRAU, de 5 para 8 ou 10 anos, consoante os casos. Relativamente à atualização das rendas, prorrogou-se ainda o congelamento das rendas para 10 anos (anteriormente, apenas cinco) quanto a arrendatários com mais de 65 anos ou incapacidade igual ou superior a 60%.
Para os investidores, a incerteza e risco do arrendamento tem vindo a tornar preferível a venda ou abandono dos imóveis ou, ainda, a aposta no alojamento local de curta duração.
Foi recentemente anunciado pelo Governo que se encontra em desenvolvimento um novo instrumento de segurança aplicável aos contratos de arrendamento, no sentido de proteger tanto os senhorios como os inquilinos, diminuindo o risco existente neste mercado. Instrumento este com três componentes: incumprimento, cobertura de multirriscos e quebra súbita de rendimentos. Este instrumento pretende possibilitar que os inquilinos fiquem dispensados de prestar caução ou recorrer a um fiador quando celebram um contrato de arrendamento.
Prevê-se ainda que, ainda durante o primeiro trimestre do presente ano seja posto em prática o Programa de Arrendamento Acessível prevê a atribuição de benefícios fiscais em sede de IRS e IMI aos proprietários que coloquem os seus imóveis no mercado de arrendamento habitacional de longa duração com rendas acessíveis – aplicável tanto ao arrendamento integral de um imóvel como de uma parte da habitação.
Não obstante, continuam a ser apresentadas propostas que vão no sentido de aumentar o condicionamento à atividade económica e proteger os arrendatários, tais como o Projeto de Lei n.º 770/XIII/3.ª apresentado pelo PCP, que sugere, primordialmente, revogar por completo a revisão do arrendamento trazida pela Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto.
Prevê-se, em sentido de conclusão, a manutenção deste regime de instabilidade enquanto continuar a ser visualizada a relação entre o senhorio e arrendatário como posições antagónicas num conflito maioritariamente político e não for considerado como prioritário estabelecer um regime estável ao invés de meramente defensório.