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News & MediaLatest NewsA obrigatoriedade de cedências para habitação a custos controlados

15 de Abril, 2024

A 4 de março de 2024 entrou em vigor o Decreto-Lei n.º 10/2024, mais conhecido por “Simplex Urbanístico”, promovendo alterações de diversos diplomas relacionados com os licenciamentos no âmbito do urbanismo e ordenamento do território.

Entre os diplomas alterados, encontra-se o Regime Jurídico da Urbanização e Edificação (RJUE), que, nos seus art.ºs 43.º e 44.º, passou também a impor a inclusão de áreas destinadas a habitação pública a custos controlados ou para arrendamento acessível nos projetos de loteamento, bem como nas operações de impacto semelhante ou relevante.

Ora, esta obrigação se encontrava estabelecida anteriormente quanto a áreas destinadas à implementação de espaços verdes e de utilização coletiva, infraestruturas viárias e equipamentos. A diferença reside no facto de que agora a lei determina ealarga esta obrigação de cedência às áreas para construção de habitação pública a custos controlados ou para arrendamento acessível, em sequência da publicação e implementação das medidas constantes do “pacote Mais Habitação”.

A previsão desta nova obrigação reflete uma intenção de promover a oferta de habitação a custos acessíveis, em consonância com iniciativas anteriores já refletidas noreferido Programa Mais Habitação, que aprovou, precisamente, um conjunto de medidas caracterizadas para promoção de habitação acessível a “todos”.

Posteriormente ao Simplex Urbanístico, a 29 de fevereiro, foi publicada a Portaria 75/2024, que procedeu à primeira alteração à Portaria n.º 216-B/2008, de 3 de março, quejá fixava os parâmetros para o dimensionamento das áreas destinadas a espaços verdes e de utilização coletiva, infraestruturas viárias e equipamentos de utilização coletiva.

Todavia, os valores dos parâmetros para o dimensionamento das referidas áreas previstos nesta portaria têm uma aplicação meramente supletiva, aplicando-se apenas até que os planos territoriais municipais e intermunicipais estabeleçam parâmetros de dimensionamento específicos para a respetiva finalidade, nos termos do RJUE.

Desta forma, verifica-se uma verdadeira dependência dos municípios no que respeita à adaptação dos parâmetros necessários ao respetivo município, com especial incidência agora na fixação dos parâmetros e condições para a habitação a custos controlados e para a renda acessível que, em conformidade com as necessidades verificadas, vão determinar as áreas que devem ser cedidas neste âmbito, concretizando, posteriormente,as respetivas obrigações no momento do licenciamento.

Reconhecidamente, esta medida legislativa, conforme atualmente formulada, acarreta um elevado grau de incerteza quanto à sua efetiva implementação. Isto deve-se ao facto de os promotores não terem forma de saber com o que contar nem, em última instância, que percentagem de espaço é que as câmaras municipais podem exigir, uma vez que os parâmetros para o dimensionamento destas áreas fixados na referida portariasão apenas de aplicação supletiva, encontrando-se dependentes do desenvolvimento de planos municipais atualizados, que prevejam parâmetros específicos para a habitação.

Uma outra questão que se coloca está relacionada com o facto de nos termos dos parâmetros para dimensionamento destas áreas definidos por esta portaria, as cedências para habitação de custos controlados, tal como para habitação pública ou para arrendamento acessível, poderem – ou não – ser interpretadas como equiparadas aos equipamentos de utilização coletiva, porquanto o legislador lhes atribuiu, ainda que apenas supletivamente, iguais parâmetros de dimensionamento. Em concreto, fica a dúvida se, optando o legislador por realizar esta equiparação, a mesma pode ser transposta para os planos municipais até que estes sejam atualizados pelos municípios de forma a prever os parâmetros específicos para o dimensionamento da habitação, no sentido de, onde estes planos atualmente referem equipamentos de utilização coletiva, se poder ler também como habitação a custos controlados.

Adicionalmente, não se demonstra claro se a realização destas cedências é, efetivamente, obrigatória, ou se, pelo contrário, existe a possibilidade de, em alternativa, ser possível efetuar-se o pagamento em compensação ao município.

Esta questão coloca-se, principalmente, perante a disposição inalterada do n.º 4 do artigo 44.º do RJUE, que prevê que se o prédio a lotear já estiver servido pelas infraestruturas referentes a obras de urbanização ou não se justificar a localização de qualquer equipamento ou espaço verde públicos no referido prédio, não há lugar a qualquer cedência para esses fins, ficando, no entanto, o proprietário obrigado ao pagamento de uma compensação ao município. Ora, diante da manutenção inalteradadeste preceito e consequente ausência de previsão legal expressa para a possibilidade de dispensa de cedências para o domínio público no âmbito da habitação acessível,com consequente pagamento de compensação, surge a questão sobre a possibilidade de aqui se poder – ou não enquadrar uma eventual situação onde não se justifique a cedência de áreas destinadas a habitação a custos controlados e, consequentemente, se o promotor permanecerá sempre obrigado a cedê-las.

Em síntese, o Simplex Urbanístico, no âmbito do Programa “Mais Habitação”, introduziu a obrigação do promotor ceder gratuitamente áreas destinadas à habitação a custos controlados. No entanto, questões sobre a forma de implementação, como a dependência de atualização dos planos municipais por parte das autarquias e a incerteza relativamente à obrigatoriedade da cedência, nomeadamente, no âmbito da possibilidade alternativa de pagamento de compensação, persistem e serão, certamente, decididas caso a caso por cada um dos municípios na falta de regulação municipal expressa nesta matéria. Deste modo, estas incertezas destacam a necessidade de uma clarificação legislativa, por forma a garantir uma aplicação eficaz destas medidas e, consequente, mais habitação acessível.

por Henrique Moser, Ana Cristina Borges e Sara Ferreira Gonçalves, Área de Prática – Direito Imobiliário e Urbanismo

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