Está em curso o processo legislativo de implementação de medidas especiais de contratação pública e de alteração do Código dos Contratos Públicos (“CCP”), propostas pelo Governo à Assembleia da República (Proposta de Lei n.º 41/XIV/1.ª).
O pacote legislativo em apreciação visa, por um lado, promover a simplificação procedimental e por outro contribuir para a aceleração da execução de projetos cofinanciados por fundos europeus. É, igualmente, dado especial enfoque sobre contratos celebrados noutras áreas de especial prioridade política.
Entre as medidas especiais de contratação pública que têm gerado maior polémica, encontram-se as referentes aos procedimentos pré-contratuais relativos à execução de projetos cofinanciados por fundos europeus, vertidas no artigo 2.º da Proposta de Lei. Assim, para a celebração de contratos com este objeto, as entidades adjudicantes passam a poder:
a) Recorrer a procedimentos de consulta prévia, com convite a pelo menos cinco entidades (atualmente o número mínimo de entidades a convidar é três), quando o valor do contrato for inferior aos limiares referidos nos nºs 2, 3 e 4 do artigo 474.º do CCP, que à data são os seguintes:
i. Para os contratos de concessão de serviços públicos e de obras públicas: € 5.350.000;
ii. Para os contratos de empreitada de obras públicas: € 5.350.000;
iii. Para os contratos públicos de fornecimentos de bens, de prestação de serviços e de concursos de conceção, adjudicados pelo Estado: € 139.000;
iv. Para os contratos públicos de fornecimentos de bens, de prestação de serviços e de concursos de conceção celebrados pelas entidades que operam nos setores da água, da energia, dos transportes e dos serviços postais: € 428.000;
v. Para os contratos públicos relativos a serviços sociais e outros serviços específicos enumerados no anexo IX ao CCP, celebrados pelas entidades que operam nos setores da água, da energia, dos transportes e dos serviços postais: € 1.000.000;
vi. Para os contratos públicos de fornecimentos de bens, de prestação de serviços e de concursos de conceção, adjudicados por outras entidades adjudicantes: € 214.000;
vii. Para os contratos públicos relativos a serviços sociais e outros serviços específicos enumerados no anexo IX ao CCP: € 750.000.
Esta medida representa um aumento substancial dos valores abaixo dos quais se admite o recurso ao procedimento de consulta prévia, que atualmente se fixam nos € 150.000, € 75.000 e € 100.000, consoante se trate de contratos de empreitadas de obras públicas, contratos públicos de fornecimentos de bens, de prestação de serviços e de concursos de conceção ou outros contratos.
b) Iniciar procedimentos de ajuste direto simplificado nos termos do artigo 128.º do CCP, quando o valor do contrato for igual ou inferior a € 15.000. No CCP, o ajuste direto simplificado pode ser adotado para a formação de um contrato de aquisição ou locação de bens móveis e de aquisição de serviços cujo preço contratual não seja superior a € 5.000, ou no caso de empreitadas de obras públicas, a € 10.000.
Trata-se de um procedimento com convite a, apenas, uma entidade, no qual a adjudicação pode ser feita pelo órgão competente para a decisão de contratar, diretamente, sobre uma fatura ou um documento equivalente apresentado pela entidade convidada, com dispensa de tramitação eletrónica e de quaisquer outras formalidades previstas no código, incluindo as relativas à celebração do contrato e à publicitação prevista no artigo 465.º.
c) Reduzir o prazo para apresentação de propostas e candidaturas em concursos públicos, para 15 dias, e concursos limitados por prévia qualificação, para 15 dias para a apresentação de candidaturas e para 10 dias para a apresentação de propostas, sem necessidade de fundamentação.
Adicionalmente, para as consultas prévias abrangidas por este regime especial não se aplicam as limitações constantes dos nºs 2 a 6 do artigo 113.º do CCP. Isto significa que podem ser convidadas a apresentar propostas entidades às quais a entidade adjudicante já tenha adjudicado, no ano económico em curso e nos dois anos económicos anteriores, na sequência de consulta prévia adotados em função do valor, propostas para a celebração de contratos cujo preço contratual acumulado seja igual ou superior a € 150.000, para empreitadas de obras públicas e € 75.000, para a locação, aquisição de bens móveis ou aquisição de serviços. E, também, entidades que tenham executado obras, fornecido bens móveis ou prestado serviços à entidade adjudicante, a título gratuito, no ano económico em curso ou nos dois anos económicos anteriores, ainda que o tenham feito fora do Estatuto do Mecenato.
Note-se que, talvez procurando garantir uma maior transparência, a Proposta de Lei obriga, ao contrário do regime geral do CCP, a tramitação dos procedimentos abrangidos por este regime especial através de plataforma eletrónica utilizada pela entidade adjudicante. Neste ponto, fica a dúvida sobre se esta exigência se aplica aos procedimentos de ajuste direto simplificado que, conforme referido, estão dispensados de tramitação eletrónica no CCP.
No quadro das alterações propostas ao CCP, encontram-se, igualmente, regras especiais para os procedimentos pré-contratuais relativos à execução de projetos cofinanciados por fundos europeus.
Assim, o artigo 36.º, que desde a alteração introduzida pelo Decreto-Lei n.º 111-B/2017, de 31 de agosto, passou a prever no n.º 3 que a decisão de contratar, quando o valor do contrato for igual ou superior a € 5.000.000 (ou de 2.500.000 no caso de parcerias para a inovação), deve ser precedida de uma avaliação de custo/benefício, exclui desta obrigação, no novo n.º 4, os procedimentos de formação de contratos que tenham por objeto a execução de projetos cofinanciados por fundos europeus, para além dos demais abrangidos pela Proposta de Lei n.º 41/XIV/1.ª.
Ficamos, assim, a aguardar os resultados da discussão da presente Proposta de Lei pela Assembleia da República e pela versão final que da mesma resultará.