A Lei n.º 83/2021, de 6 de dezembro, trouxe inúmeras e impactantes novidades laborais, designadamente através de alterações e aditamentos ao atual Código do Trabalho, entre os quais sublinhamos a adição do artigo 199.º-A, o qual versa sobre o novo “Dever de abstenção de contacto”.
Esta norma, que entrou em vigor a 1 de janeiro de 2022, estabelece que o empregador tem o dever de se abster de contactar o trabalhador no período de descanso, excecionadas situações de força maior, sendo a mesma aplicável a todos os trabalhadores, independentemente das suas funções e da forma como as exerçam, aplicando-se a trabalhadores presenciais e remotos.
Surge, contudo, a questão de saber o que entender por “situações de força maior”. Segundo entendemos, tal análise deverá ser feita ao abrigo da lei civil, de acordo com a qual o conceito de “força maior” tem subjacente a ideia da inevitabilidade, isto é, será todo o conhecimento natural ou ação humana que, embora previsível ou até presumido, não se pode evitar, nem em si mesmo nem nas suas consequências, como, por exemplo, incêndios, cheias, desastres naturais, guerra, prisão, roubo, motins, rebeliões, ordem da autoridade, falha generalizada de telecomunicações, entre outras.
Permitindo esta norma a existência de zonas cinzentas, o empregador deverá ponderar devidamente no momento em que pretenda contactar um trabalhador fora do horário normal de trabalho, designadamente pelo facto de a violação deste dever poder constituir contraordenação grave, sujeita à aplicação de coimas que podem variar entre € 612,00 e € 9.690,00.
Não obstante esta norma refletir a bondade do legislador para com os interesses dos trabalhadores, apresenta fragilidades assinaláveis, nomeadamente aquela que já se pode antecipar que é a potencial perda de atratividade do nosso ordenamento juslaboral para o investimento estrangeiro, em especial quando falamos do tecido empresarial, que pode agora “pensar duas vezes” antes de escolhere Portugal como país de destino para investir e aqui contratar trabalhadores.
por Pedro da Quitéria Faria e Rita Robalo de Almeida, Área de Prática – Direito do Trabalho e da Segurança Social