A Lei de Bases da Habitação (aprovada pela Lei n.º 83/2019, de 3 de setembro) entrou em vigor no passado dia 1 de outubro de 2019, tendo demorado mais de um ano a ser discutida, com o intuito de definir as diretrizes da habitação em Portugal.
O direito à habitação encontra-se consagrado na Constituição da República Portuguesa de modo, praticamente, inalterado desde 1976.
Porque surgiu, então, agora, a necessidade de vir regular este direito fundamental? Esta lei de bases pretende estabelecer os limites e contornos do direito à habitação e do papel do Estado enquanto seu garante. E surge numa época conturbada do mercado imobiliário em Portugal. Dedica-se, especialmente, às classes mais afetadas pelo crescimento do mercado imobiliário e que veem a sua posição cada vez mais desprotegida: jovens, cidadãos com deficiência (no âmbito das acessibilidades), pessoas idosas e famílias com menores, monoparentais ou numerosas.
Versa sobre temas, tais como:
– Promoção habitacional – incentivo à utilização de imóveis com caráter habitacional, detidos pelo Estado, devolutos, através, por exemplo, da colocação dos mesmos ao serviço dos programas de arrendamento com rendas acessíveis; incentiva também o uso das habitações privadas devolutas, especialmente em zonas centrais;
– Habitações devolutas – habitação devoluta passa a ser considerada toda aquela que continue injustificada e continuadamente sem uso habitacional, por motivos imputáveis ao seu proprietário, e que poderá estar sujeito a multas;
– Política Nacional e Municipal de Habitação – prevê a criação do Programa Nacional de Habitação que se pretende venha a identificar todas as carências habitacionais, e implica a mobilização do património público para arrendamento e a promoção da construção, reabilitação ou aquisição para habitação pública; concede autonomia às regiões autónomas e às autarquias locais para programar e executar as suas próprias políticas de habitação e fixar taxas diferenciadas de impostos de habitação.
– Conselho Nacional de Habitação – criação de entidade responsável por elaborar o Relatório Anual de Habitação;
– Apoios e subsídios – criação de subsídios para os cidadãos que não tenham condições de aceder ao mercado privado de habitação e que estejam numa situação de especial vulnerabilidade económica; proteção adicional para os sem-abrigo, menores vítimas de abandono ou maus tratos, vítimas de violência doméstica, de discriminação ou marginalização habitacional;
– Proteção em caso de despejo, limitando o despejo pelo Estado e pelas autarquias locais que não garanta soluções de realojamento; estabelece-se, ainda, o atendimento prioritário, pelas entidades competentes, para as pessoas e famílias afetadas;
– Assegurar celeridade dos processos de heranças indivisas que incluam bens imóveis com aptidão habitacional;
– Crédito à habitação – a lei passa a agora a admitir a dação em cumprimento da dívida, extinguindo as obrigações do devedor independentemente do valor atribuído ao imóvel para esse efeito, desde que contratualmente estabelecido;
– Reabilitação com regras antissísmicas – estabelece a necessidade de a reabilitação urbana de edifícios observar condições de eficiência energética, vulnerabilidade sísmica e acessibilidade;
– Fiscalização de condomínios ao nível dos fundos de reserva obrigatórios para custear despesas de conservação nas partes comuns do edifício, nomeadamente avaliando se o fundo efetivamente existe e se está a ser usado para os fins legalmente previstos;
– Condições preferenciais dos condomínios no acesso a programas de requalificação e reabilitação urbana;
– Promoção da construção sustentável, por parte dos programas públicos de reabilitação e edificação, privilegiando a utilização de materiais disponíveis localmente;
– Promoção pública de arrendamento, através da possibilidade de o Estado e as autarquias locais colocarem parte do seu património ao serviço de programas habitacionais públicos, podendo os imóveis ser disponibilizados em regime de direito de superfície, salvaguardando a manutenção da propriedade pública;
– Arrendamento de longa duração – o Estado deve privilegiar o arrendamento sem termo ou de longa duração;
– Fiscalização dos arrendamentos – pretende-se que as condições de habitabilidade dos imóveis públicos, arrendados ou subarrendados, sejam fiscalizadas periodicamente, numa tentativa de combater situações encapotadas de arrendamento ou subarrendamento habitacional;
– Direito de preferência do Estado e municípios – o Estado e as autarquias locais poderão recorrer à posse administrativa, ao direito de preferência e, se necessário, à expropriação mediante indemnização. No caso de venda de imóveis em conjunto, o Estado e os municípios têm direito de preferência para cada um dos imóveis, direito esse que não prejudica o direito de preferência dos arrendatários na compra e venda ou dação em cumprimentos;
– Proteção no arrendamento privado
Promoção da criação de seguros de renda;
Mecanismos de garantia alternativos ao fiador;
Proibição de concessão de condições mais desfavoráveis de pagamento dos créditos ao fiador das concedidas ao arrendatário;
Instrumentos de defesa dos direitos de senhorios e arrendatários em caso de incumprimento;
Proibição de assédio no arrendamento.
Esta Lei de Bases prevê, ainda, um prazo de nove meses para a sua adaptação ao quadro legal e regulamentar.