info@goldenblatt.co.uk
49 Russell Square, London, UK

News & MediaNewslettersCriptomoedas, CBDC’s e Stablecoins: Qual o futuro do dinheiro?

16 de March, 2021

O valor do dinheiro é um dos temas mais controversos quando entramos no mundo da economia. Tudo começou com as trocas diretas e a ideia de que, havendo pessoas disponíveis, seria um bom negócio trocar uma laranja por uma maçã. Mas o problema ganhava expressão quando havia muita gente disponível para receber maçãs e pouca gente disponível para as trocar por bananas. Este dilema rapidamente foi resolvido pelos bens essenciais dotados de valor superior (moeda mercadoria) – como foi o caso do sal – que permitia conservar os alimentos, era muito desejado por muita gente, serviu de pagamento aos soldados romanos e acabou por dar origem à palavra salário.

Depois vieram os metais preciosos, a moeda escritural – os ourives emitiam recibos pelo ouro guardado – a moeda baseada no padrão ouro e, depois, o dinheiro inconversível. Ora, o dinheiro inconversível é aquele que não está baseado em qualquer padrão ou representativo de outro qualquer ativo. É um dinheiro que tem valor porque cada um de nós confia nesse valor. Trata-se do dinheiro fiduciário dos dias de hoje.

Consequentemente, e desde a criação da internet, assistimos ao fenómeno da desmaterialização da informação em todas as suas formas, desencadeando o aparecimento de uma nova economia: “A Economia Digital”, que se traduz numa nova metodologia de celebrar negócios, integrados num ecossistema em rede utilizando dados e tecnologia como meios de comunicação, transferência de dados e transações comerciais.

Neste contexto de desenvolvimento da Economia Digital faltava o que Milton Friedman, vencedor do Prémio Nobel da Economia, acreditava descobrir-se, em breve: “um e-cash confiável[1]. O primeiro exemplo de sucesso poderá ser reportado à criação da Bitcoin, em 2009. Entravamos no mundo das criptomoedas.

No entanto, as criptomoedas continuam a não consistir num meio de pagamento para a economia envolvente, o que as torna pouco úteis. Afinal, será que consigo comprar bens essenciais com criptomoedas? A resposta continua a ser negativa. E é por serem utilizadas apenas como reserva de valor que estas realidades assumem elevada volatilidade, baseando-se a sua valorização na especulação dos seus investidores e espectadores.

Paralelamente, surgiram as stablecoins, que são criptomoedas de valor estável e que não se encontram sujeitas à volatilidade das demais criptomoedas. Existem 4 tipos de stablecoins, a saber: as stablecoins centralizadas, a título de exemplo Tether e Stasis EURO, indexadas à moeda fiat – o dólar e o euro, respetivamente; as stablecoins com lastro em outras criptomoedas, como por exemplo a Dai; stablecoins com lastro em metais preciosos, obras de arte, imóveis entre outros bens materiais; e as stablecoins sem qualquer lastro, sendo o valor da moeda controlado pela influência que os algoritmos exercem nos ativos em circulação.

Mais recentemente, vários Bancos Centrais estão a estudar e a desenvolver as suas próprias moedas digitais: as CBDC’s (do inglês Central Bank Digital Currency), moedas digitais, emitidas pelos bancos centrais, que correspondem a massa monetária, combinando a funcionalidade das transações, em meio eletrónico, com a promoção da inclusão e do acesso universal ao mercado financeiro.

Ao contrário das criptomoedas, as CBDC’s são emitidas por uma entidade reconhecida pelo Estado, principal responsável pela regulação das transações realizadas, sendo, portanto, um ativo centralizado – ao contrário das criptomoedas que são executadas numa blockchain open source, ou seja, numa plataforma descentralizada.

Até ao fim do ano de 2021, pelo menos 41 bancos centrais irão emitir a sua própria moeda digital, segundo o registo do Banco de Compensações Internacionais (BIS). A União Europeia terminou a consulta pública em janeiro de 2021 e o Banco Central Europeu, em breve, tornará o Euro Digital parte do nosso dia-a-dia. Todavia, a China assume, com larga vantagem, o pódio internacional com testes que já somam dezenas de milhões de yuans digitais. Mas afinal, o que são moedas digitais e qual o interesse dos bancos centrais em emiti-las?

A situação pandémica e as medidas sanitárias de distanciamento social, implementadas a nível mundial, foram um importante propulsor junto dos Bancos Centrais na emissão das CBDC’s, mas este movimento financeiro assentou, essencialmente, em 3 motivos:

  • A necessidade de os Bancos Centrais tomarem posição na trama da transformação digital, por forma a continuarem a deter o controlo sobre os fundamentos da política monetária. O que poderia vir a ser abalado com o lançamento das moedas digitais privadas, desde a bitcoin à libra, a moeda virtual que o Facebook pretende emitir. Claro está que os Bancos Centrais também se encontram motivados pelos benefícios inerentes às moedas digitais, no entanto, se este esforço for mal executado pode tornar-se num movimento arriscado;

 

  • O uso decrescente do papel-moeda e preferências por meios de pagamento digitais, que pode vir a representar uma alternativa para incluir populações vulneráveis no sistema de pagamentos e reduzir a criminalidade associada à impressão do papel-moeda. Neste contexto a Suécia apresenta uma visão bastante inovadora acreditando que será possível atingir um estádio cashless; e

 

  • A consequente digitalização dos meios de pagamento, representando as CBDC’s uma alternativa segura, económica e eficiente para a realização de pagamentos nacionais e internacionais, visto que a sua implementação se baseia em DLT’s (do inglês Distributed Ledger Technology).

 

Deste modo, coloca-se a questão: As moedas digitais vão substituir o dinheiro que conhecemos? É inegável que existe alguma especulação junto da sociedade acerca do impacto que as moedas digitais terão sobre o papel-moeda. Será que as moedas digitais farão ao dinheiro físico o que a internet fez aos media?

Pensamos que não seja bem assim. O papel-moeda e os meios de pagamento, tal como hoje os conhecemos, não irão acabar – pelo menos não num futuro mediato. Os Bancos Centrais tomarão uma posição ponderada, respeitando que a opção pela moeda digital seja algo natural.

Apesar das vantagens evidentes da migração de um sistema financeiro materializado para o domínio do digital, através da emissão das próprias CBDC’s, desde logo a redução dos custos envolvidos na emissão do papel-moeda – no limite a sua eliminação -, bem como o aumento da eficiência do sistema, por via da tecnologia blockchain, as desvantagens não podem ser desconsideradas.

A desvantagem que mais tem deixado os economistas reticentes prende-se com as limitações geográficas resultantes da possibilidade de as CBDC’s apenas serem aceites no país que as emitiu, bem como as limitações ao volume da sua emissão que poderá gerar grandes fossos sociais[2], além dos problemas da infraestrutura que poderão emergir de possíveis falhas na energia elétrica ou conexão à internet.

Entendemos que as CBDC’s, por via da sua estabilidade, permitirão a sedimentação de um clima de confiança junto dos atores do sistema financeiro, sendo uma realidade que, muito em breve, fará parte do nosso dia-a-dia. A grande falha que se aponta às criptomoedas consiste no facto de há mais de uma década continuarem ao serviço da especulação, não se consubstanciando em massa monetária, não sendo possível realizar uma transação tão simples como a compra de um café, numa pastelaria ao lado das nossas casas.

É necessário um equilíbrio entre o modelo da economia centralizada (CeFi) e o modelo da economia descentralizada (DeFi), sendo as CBDC’s a perfeita junção entre dois mundos.

Urge repensar todo o sistema financeiro e o ordenamento jurídico, que o suportará, para que esta prática funcione corretamente será necessário garantir compliance nestas entidades emissoras que agora estarão sujeitas ao sistema de auto-execução.

 

por Nuno da Silva Vieira e Ana Peixoto, Área de Prática – Legal Intelligence

 


[1] Cfr.vídeo disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=6MnQJFEVY7s.

[2] Cfr. resulta do “Report on a digital euro”, p.17, disponível em: https://www.ecb.europa.eu/pub/pdf/other/Report_on_a_digital_euro~4d7268b458.en.pdf.

https://adcecija.pt/wp-content/uploads/2020/06/logo_horizontal_b-768x75.png
LISBOA
Edifício Amoreiras Square
Rua Carlos Alberto da Mota Pinto, 17 - 2.º piso
1070-313 Lisboa
PORTO
Rua Eugénio de Castro, n.º 352, 2.º andar, sala 26
4100-225 Porto
BRAGA
Rua de Janes, n.º 20, 1.º andar, sala 101
4700-318 Braga

* Chamadas sem custos adicionais, sujeito apenas à tarifa de base.

SOCIAL