info@goldenblatt.co.uk
49 Russell Square, London, UK

News & MediaA Denúncia por Ex-Sócio do Aval em Livrança

14 de Setembro, 2018

As Sociedades Comerciais recorrem cada vez mais a algo chamado crédito revolving, ou até mesmo a financiadores independentes para sustentar os seus custos de funcionamento, o que envolve na maioria das vezes a subscrição de uma livrança que devido às suas características, tem por regra ser o denominado no nosso direito por livrança em branco visto que o valor apenas será determinado a posteriori.

Ao recorrer ao uso de tais títulos de crédito, muitas vezes é necessário que um dos sócios actue como garante, e conceda o seu aval, de modo a garantir maior segurança ao financiador.

A questão que se levanta aqui, prende-se com o que sucede no caso de o sócio avalista alienar a sua quota/participação a terceiro.

Terá ele de se manter enquanto avalista, ou poderá denunciar o aval e exonerar-se da sua obrigação de garante?

Alguma Doutrina defende que o sócio garante por via de livrança em branco deve ser tratado de igual modo ao sócio garante fidejussório, sendo-lhe facultado que possa denunciar ou resolver a relação fidejussória, fruto da relação direta emergente avalista e financiador, que reveste uma natureza quase contratual.

É então entendido que deixando de existir interesse objetivo na atividade da sociedade, a obrigação de garante deixa de ser exigível ao ex-sócio, devendo ser-lhe possível exonerar-se da mesma.

Analisando ainda mais a fundo, entende-se que apenas mediante uma análise profunda das circunstâncias de cada caso, mais especificamente do contrato de crédito estipulado entre as partes, será possível tirar as devidas ilações.

Ainda assim, em última análise, será concebível envergar pelo instituto do abuso de direito para defender a posição do ex-sócio.

Outra posição baseia a sua construção num desmembramento do pacto de preenchimento.

Entende-se aqui que não se trata de uma emancipação do aval relativamente à relação subjacente, mas antes de operar a desvinculação do ex-sócio do pacto de preenchimento celebrado.

A fundamentação para uma lícita resolução do pacto de preenchimento é uma inexigibilidade superveniente, desde que, menciona esta vertente Doutrinária, não seja considerada abusiva.

Uma vez resolvido o pacto, o avalista apenas responderia pelas dívidas resultantes do período em que foi eficazmente garante da obrigação.

Também o Supremo Tribunal de Justiça foi chamado a pronunciar-se sobre esta problemática.

O Tribunal considerou que o ex-sócio não poderia denunciar o aval, pois a livrança é um título de crédito abstrato, autónomo, e, portanto, a obrigação que dele decorre não se encontra associada à relação subjacente.

As formas de desvinculação da obrigação cartular consistem apenas nas previstas na LULL, como por exemplo o decurso do prazo ou o seu cumprimento.

Ora, expostas três posições conceituadas no nosso direito, cabe agora analisá-las e expor opinião.

É certo que o título de crédito (livrança neste caso) é autónomo da relação subjacente, e a cessão da quota e consequente desvinculação do sócio não seria motivo para considerar ineficaz a garantia prestada pelo mesmo.

Contudo, obrigar o ex-sócio a ficar indeterminadamente vinculado a um interesse que já não coincide com o seu parece algo descabido e demasiadamente penalizador para quem visou conferir apenas uma garantia.

A posição que defende “atacar” de certo modo o pacto de preenchimento, ou seja, o núcleo da questão, de modo a conseguir exonerar o sócio da sua obrigação de garante parece-nos bem construída, e mais simplista que a outra posição referida, que se baseia numa permissão concedida ao sócio fidejussório para criar uma analogia para o sócio avalista. Ainda assim, é certo que ambas são posições muito bem desenvolvidas e que abordam de uma forma elegante um problema recorrente na prática das Sociedades Comerciais.

Quanto à posição do Supremo Tribunal de Justiça, parece-nos algo desfasada, visando obrigar o sócio a permanecer ligado à garantia prestada simplesmente para acautelar os direitos do financiador, que na maioria das vezes consiste numa entidade bancária.

O princípio da autonomia dos títulos de crédito visa atingir como principal objetivo, que vícios e exceções emergentes da relação subjacente não impeçam a eficaz circulabilidade do título, permitindo que o comércio seja estimulado por força do crédito.

Este superior interesse do comércio, por assim dizer, é visível em quase todo o regime do direito comercial, desde o trespasse, aos agora analisados títulos de crédito.

Tendo isto em mente, penso que no caso de alienação da quota deveria ser acompanhada da transmissão do aval, algo semelhante ao previsto no artigo 599º do Código Civil.

A alínea 1 do artigo 599º prevê a transmissão das garantias que não sejam inseparáveis da pessoa, o que neste caso me parece antes associado ao sócio da Sociedade enquanto figura do sócio. Ou seja, algo inerente ao estatuto de sócio seria neste caso, a obrigação de garantir na livrança em questão.

Indo um pouco contra o princípio da autonomia do aval, resolver-se-ia o problema pela sua transmissão como uma simples garantia, incluída no negócio aquando da transmissão da quota ou participação.

Outra possibilidade, mais simplista, mas menos controversa, seria as partes ao abrigo da autonomia privada, estabelecerem este regime e tornarem o novo sócio avalista, exonerando o anterior de uma obrigação sobre a qual já não possui qualquer interesse objetivo.


  1. Sociedade fixa com financiador um limite máximo de crédito de poderá ser utilizado, mas caso o crédito ultrapasse tal montante, poderá ser reutilizado de acordo com os pagamentos que foram efetuados.
  2. Uma livrança menciona uma promessa de pagamento de uma certa quantia, em dadas condições de tempo e lugar, pelo seu subscritor a favor do tomador ou posterior endossado.
  3. Negócio cambiário unilateral pelo qual um terceiro se obriga ao seu pagamento, como garante.
  4. Livrança que se considera incompleta em alguns dos seus elementos (artigo 1º LULL por remissão do artigo 77º) mas que ainda assim vale como tal por se encontrar completa nos elementos essenciais.
  5. Admite-se que o fiador possa denunciar (ou resolver) a relação fidejussória.
  6. Aquando da subscrição de uma livrança em branco, as partes acordam como se deverá proceder o seu preenchimento futuro. O não cumprimento do estipulado será tido como preenchimento abusivo.
  7. Lei Uniforme de Letras e Livranças
  8. Decorrente do princípio da autonomia dos títulos de crédito.

 

https://adcecija.pt/wp-content/uploads/2020/06/logo_horizontal_b-768x75.png
LISBOA
Edifício Amoreiras Square
Rua Carlos Alberto da Mota Pinto, 17 - 2.º piso
1070-313 Lisboa
PORTO
Rua Eugénio de Castro, n.º 352, 2.º andar, sala 26
4100-225 Porto
BRAGA
Rua de Janes, n.º 20, 1.º andar, sala 101
4700-318 Braga

* Chamadas sem custos adicionais, sujeito apenas à tarifa de base.

SOCIAL