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News & MediaLatest NewsO âmbito de aplicação do art. 640º, n.º 1, alínea c) do CPC às conclusões de recurso

30 de Novembro, 2023

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 12/2013

A obrigatoriedade de inclusão da decisão alternativa proposta pelo recorrente, relativamente à matéria de facto impugnada, nas conclusões de recurso

 

Questão a decidir: saber se a decisão alternativa proposta pelo recorrente relativamente aos pontos de facto impugnados deve constar das conclusões de recurso, sob pena de rejeição do mesmo.

Em 17.10.2023, o pleno das secções cíveis do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) proferiu um acórdão de uniformização de jurisprudência, publicado em Diário da República, 1.ª série, n.º 220, no dia 14.11.2023:

 

“Nos termos da alínea c), do n.º 1 do artigo 640.º do Código de Processo Civil, o Recorrente que impugna a decisão sobre a matéria de facto não está vinculado a indicar nas conclusões a decisão alternativa pretendida.”

Quer o acórdão recorrido[1], quer o acórdão fundamento[2], versam sobre a mesma questão fundamental de direito: o cumprimento dos requisitos do recurso de apelação, na parte em que se impugna a decisão sobre a matéria de facto, em especial no que se refere a saber se a decisão alternativa proposta pelo recorrente relativamente aos pontos de facto impugnados, deve constar das conclusões do recurso, sob pena de rejeição do mesmo.

As duas decisões que subjazem à uniformização de jurisprudência foram proferidas no domínio da mesma legislação, havendo identidade do regime normativo em que se enquadra a questão: artigo 640.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (“CPC”).

No acórdão fundamento privilegiou-se uma interpretação literal do referido preceito legal, tendo o recurso quanto à impugnação da matéria de facto sido rejeitado, porque o recorrente não especificou, nas conclusões, os concretos pontos de facto que considerava incorretamente julgados, por referência ao consignado na sentença relativamente aos factos provados e não provados.

Em síntese, o acórdão fundamento baseou-se na seguinte argumentação:

  • As conclusões não representam apenas a súmula dos fundamentos aduzidos nas alegações stricto sensu, sendo nelas que se baliza o objeto do recurso e, por conseguinte, o conhecimento do tribunal;
  • Por menor exigência formal que se adote relativamente ao cumprimento dos ónus previstos no artigo 640.º do CPC, sempre se imporá que o tribunal ad quem não fique obrigado a substituir-se ao recorrente na concretização do objeto do recurso.

 

No acórdão recorrido foi decidido apreciar o recurso quanto à matéria de facto, por se entender que “Se devem ser indicados nas conclusões os concretos pontos de facto que se consideram incorretamente julgados, já no que se refere à decisão a proferir sobre esses pontos basta que ela conste da motivação”.

Para fundamentar a jurisprudência firmada, o STJ invocou as seguintes premissas (comuns ao acórdão recorrido):

  • Mostra-se consagrada uma efetiva existência de um segundo grau de jurisdição na apreciação da matéria de facto, com uma imposição rigorosa dos ónus cuja inobservância determina a imediata rejeição do recurso;
  • O cumprimento dos ónus previstos no artigo 640.º do CPC não deve redundar numa sobrevalorização da exigência formal, de tal modo que seja violado o princípio da razoabilidade e proporcionalidade;
  • Não deve ser esquecida a intenção clara de uma justiça material, dispensada de formalidades cuja irrelevância as torne inócuas, se, da conduta processual do recorrente, resultar de forma clara o que o mesmo pretende com a interposição do recurso;
  • Se, por um lado, não se revela de absoluta necessidade a indicação, nas conclusões, dos meios probatórios ou dos segmentos da gravação em que o recorrente se funda para manifestar a sua discordância com a sentença proferida, por outro lado, sempre terá de constar da definição do objeto do recurso a indicação dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados;
  • A indicação da decisão alternativa proposta deve ser vertida no corpo das alegações, de forma que não haja dúvidas quanto ao seu sentido, quer para que o contraditório possa ser exercido cabalmente, quer para que o seu sentido possa ser apreendido em termos claros pelo julgador.

 

Decorrem do artigo 640.º, n.º 1, do CPC, as exigências que impendem sobre o recorrente, traduzidas num ónus tripartido, – sob pena de rejeição do recurso – que se estribam nos princípios da cooperação, adequação, ónus de alegação e boa-fé processuais.

No entanto, deverá ter-se em consideração a adequada proporcionalidade e razoabilidade, de modo que não seja sacrificado um direito das partes em função de um rigor meramente formal, desconsiderando aspetos substanciais das alegações, e das próprias conclusões, numa prevalência da formalidade sobre a substância, que se pretende arredada.

Concluindo, o recorrente que impugne a decisão sobre a matéria de facto, cumpre o ónus constante da alínea c), do n.º 1, do artigo 640.º do CPC, se a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, constar das conclusões, mas também da leitura articulada destas últimas com a motivação do vertido na globalidade das alegações e, mesmo na sequência do aludido, apenas do corpo das alegações, desde que não se suscitem quaisquer dúvidas quanto ao seu alcance, para que o contraditório possa ser exercido cabalmente, e para que o seu sentido possa ser apreendido em termos claros pelo julgador.

Por fim, nota-se que o acórdão em análise foi proferido com dois votos de vencido e uma declaração de voto por divergência de entendimento com a formulação dada ao respetivo sumário.

 

 

por Raquel Ribeiro Correia e Carolina Fonseca, Área de Prática – Contencioso e Arbitragem

 


[1] Acórdão do STJ, proferido em 17.11.2021, no processo n.º 8344/17.6T8STB.E1.S1

[2] Acórdão do STJ, proferido em 16.05.2018, no processo n.º 2833/16.7T8VFX.L1.S1

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