Já todos – quer trabalhadores, quer empresas – estão agastados com termos como «pandemia», «teletrabalho», «novas medidas», «novas alterações», mas a verdade é que, ainda que se espere que a pandemia não tenha vindo para ficar, o mesmo não se dirá – parece – da azáfama do legislador laboral.
Estavam (e ainda estão, verdade seja dita) as empresas no rescaldo de uma reforma significativa, em outubro de 2019, ao Código do Trabalho, quando, entrando no ano 2020, foram, ao longo do mesmo, sucessiva e exaustivamente confrontadas com quase uma centena de alterações à legislação laboral.
Não contente o legislador, e tendo sido o teletrabalho impulsionado abruptamente pela crise pandémica, foram dez as propostas de lei que chegaram ao Parlamento, em maio do ano corrente, para regulamentar o teletrabalho, versando sobre o famigerado direito a desligar, a comparticipação por acréscimo de despesas, a privacidade, a proteção em contexto de acidentes de trabalho e o caráter voluntário do teletrabalho.
Ora, se a crise pandémica veio potenciar uma loucura legiferante, imperativa e premente, parece que veio também desencadear a vontade de transformar o Código do Trabalho numa verdadeira manta de retalhos. Veja-se as mais recentes propostas de 11 mudanças à lei laboral. Pior, não são simples mudanças que se pretendem operar sendo mesmo em alguns casos verdadeiras reversões das medidas aprovadas na reforma de 2019. Dessas 11 mudanças, destacam-se o polémico alargamento do período experimental para 180 dias que, em jeito ioiô, fora alargado em 2019 para jovens à procura do primeiro emprego e desempregados de longa duração e, agora, pretende reverter-se este alargamento, voltando aos primitivos 90 dias de período experimental.
Também em 2019 se reformularam os contratos especiais de muito curta duração para agora se pretender a sua eliminação. Também a contratação a termo, já de si problemática, ver-se-á mais limitada caso estas mudanças se efetivem, reduzindo o número de renovações de três para duas nos contratos a termo certo e reduzindo a duração máxima do contrato a termo incerto de 4 para 3 anos. Com tamanho estrangulamento da contratação a termo, ver-se-ão as empresas a braços com contingências de grande monta, já que a pandemia, com tantas oscilações, veio, efetivamente criar necessidades às empresas que são verdadeira e genuinamente temporárias.
Dados alguns exemplos, constata-se que, se com a situação pandémica o tecido empresarial português, tendo sido sobejamente afetado, ficou fragilizado, pior ficará se se efetivar um conjunto de mudanças que parecem ser apenas «pró-trabalhador». Onde paira o equilíbrio? Só se as empresas forem ajudadas, máxime no atual contexto, conseguirão ajudar – e manter -, por seu turno, os seus trabalhadores…
por Pedro da Quitéria Faria e Isabel Araújo Costa, Área de Prática – Direito do Trabalho e da Segurança Social