Em Portugal sempre se legislou muito. A produção legislativa constante resulta, muitas vezes, em insegurança, porque, na verdade, fica-se muitas vezes sem se saber com o que se contar no futuro. Este fenómeno foi agravado, e muito, depois da pandemia do Covid-19. Veja-se, por exemplo, a inacreditável quantidade de diplomas em matéria laboral que têm sido sucessivamente criados em apenas poucos meses. É verdade que tudo o que vivemos no presente é novo e ninguém estava preparado para esta realidade. Mas a produção legislativa em catadupa tem que ser combatida com maior ponderação e análise da realidade e dos instrumentos jurídicos eventualmente já existentes. Esta introdução serve para referir que, curiosamente, as medidas legislativas em sede de recuperação de empresas quase que escasseiam desde março. Com exceção de um ou outro ponto, a verdade é que assistimos (na feliz expressão de um colega) apenas à criação de medidas e de mecanismos que mantêm o tecido empresarial, quase todo representado por pequenas e médias empresas, “anestesiado”. A parte mais dolorosa, que é o tratamento da forma como as empresas terão que lidar com o pagamento das suas dívidas num período de quebra generalizada de rendimentos, tem merecido, do legislador, um preocupante silêncio. E, ao invés de se aproveitar o que já existe, o legislador decide enveredar pela criação de uma nova figura legal em matéria de assistência e recuperação de empresas, o PEVE (Processo Extraordinário de Viabilização de Empresas). O regime jurídico desta figura, que ainda será objeto de discussão no Parlamento, era, na nossa opinião, escusado. Escusado porque o RERE, o PER e o PEAP, com pequeníssimas afinações, são já instrumentos jurídicos que poderiam fazer com que as empresas em dificuldades pudessem negociar com tranquilidade com os seus credores, pagando as suas dívidas e mantendo a sua atividade, protegendo-se o emprego e criando-se valor. Ora, a criação de mais um mecanismo quando o nosso ordenamento jurídico já contém vários pode ser pernicioso e adita claramente pouca valia ao que temos. Por isso, o que se pede em tempos de pandemia e de exceção, é, simplesmente, maior rigor e ponderação do legislador para não se agravar aquilo que já não é fácil, sobretudo quando o que se pretende é termos melhor e mais adequada legislação.
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