O aspecto verdadeiramente fulcral na constituição de uma sociedade comercial é, à frente de quaisquer outras características jurídicas que a singularizem face a outras entidades já constituídas, o momento em que os sócios cumprem com a contribuição patrimonial devida pelas participações sociais que adquirem, isto é, o momento em que depositam o capital social nos cofres da sociedade.
A chamada realização de entradas é essencial para que um sócio adquira essa qualidade, pois, para que o seja, o sócio tem necessariamente de contribuir, no momento da constituição ou posteriormente, com bens para a sociedade. Dizemos posteriormente porque, ainda que em princípio as entradas devam ser realizadas aquando da constituição da sociedade, é possível adquirir-se a qualidade de sócio sem ainda se ter pago o valor das participações sociais subscritas, desde que exista o compromisso formal (expresso no contrato de sociedade) de que esse valor será realizado.
Sendo o princípio referido da realização das entradas na constituição da sociedade aquele que se afiguraria como o mais lógico para o robustecimento financeiro da sociedade, a sua garantia perante credores e a formalização do compromisso dos sócios, não devemos contudo ignorar as razões que levam a esta dilação das entradas em dinheiro, como sejam tornar a subscrição mais flexível para os sócios, a sociedade poder não ter necessidade no momento da sua constituição de recorrer a todo o seu capital ou até ser útil à sociedade ficar com créditos de entradas não realizadas sobre os sócios em caso de dificuldade em obter financiamento bancário.
Em todo o caso, importará distinguir entre a possibilidade de “adiamento” da realização das entradas subscritas até ao final do primeiro exercício (cfr. art. 26.º, n.º 1 do Código das Sociedades Comercias – “CSC”) e um verdadeiro “diferimento” que pode ir até ao prazo máximo de cinco anos após a data de constituição da sociedade (cfr. arts. 203.º, n.º 1 e 285.º, n.º 1 do CSC). No entanto, em ambas as hipóteses o adiamento ou diferimento da realização das entradas deverá ser fixado estatutariamente, referindo-se claramente no artigo do capital social que nenhuma ou só uma parte das entradas em dinheiro foi realizada.
No caso das sociedades por quotas, a quase totalidade das entradas em dinheiro pode ser diferida até ao prazo máximo de cinco anos, no pressuposto de o capital mínimo estar realizado (cfr. art. 199.º, al. b) do CSC), o que corresponderá ao valor mínimo da quota fixado por lei, ou seja, € 1 por cada sócio existente (cfr. art. 219.º, n.º 3 do CSC).
Já nas sociedades anónimas, a lei exige que no momento da constituição seja realizado um mínimo de 30% do valor nominal de cada acção, o que significa que apenas 70% da realização das entradas em dinheiro poderá ser adiada ou diferida (cfr. art. 277.º, n.º 2 do CSC). Com isto se conclui ainda subsistir nas sociedades anónimas o depósito obrigatório de parte do capital subscrito antes da constituição da sociedade (cfr. art. 277.º, n.º 3 do CSC), o que deixou de suceder nas sociedade por quotas.