A Ryanair não vai estar presente na Assembleia da República para prestar esclarecimentos sobre a situação laboral dos seus trabalhadores, que levou a várias greves desde o início do ano. Na próxima quarta-feira começam as audições parlamentares na Comissão de Economia, Inovação e Obras Públicas (CEIOP) com o objetivo de ouvir várias entidades sobre a política de recursos humanos da companhia de aviação low cost. A iniciativa foi do Bloco de Esquerda (BE) que apresentou, em abril deste ano, um pedido para a audição da administração da transportadora irlandesa. Mas a companhia liderada por Michael O’Leary informou, através de carta, que irá deixar a cadeira vazia. “A administração da Ryanair apresentou uma desculpa bizarra para não estar presente. Alega que, como estão em processo de negociação com vários sindicatos de pilotos nalguns países da Europa, não têm ninguém do departamento de recursos humanos disponível para estar presente”, refere o deputado do Bloco, Heitor de Sousa.
O também membro da CEIOP adianta que o requerimento é bem explicito: “solicitámos a presença de representantes do conselho de administração da Ryanair em Portugal e não do departamento de recursos humanos”. Ao DN/Dinheiro Vivo a Ryanair disse que não tem “mais nada a acrescentar sobre este assunto”. Na impossibilidade de ter um representante da transportadora low-cost no Parlamento, o BE pediu a presença de várias outras entidades. A primeira a ser ouvida será o Sindicato Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil (SNPVAC). Também a Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), a Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT) e a ANA Aeroportos estão na lista para as audições a decorrer durante o mês de setembro.
O SNPVAC considera que a recusa da Ryanair em estar presente na CEIOP “denota a falta de respeito pelo nosso governo”. O representante da estrutura sindical, Bruno Fialho, espera que este seja o primeiro passo para uma mudança de ventos. “Aguardamos que os deputados da nação tenham dureza e firmeza nesta questão e que a Ryanair seja obrigada a atuar de acordo com a legislação laboral e a constituição do nosso país”. O BE apresentou, no dia 27 de julho, um projeto de resolução no qual “recomenda ao governo que tome as diligências necessárias para obrigar a Ryanair e as suas agências de recrutamento, Crewlink e Workforce Internacional, a aplicar a legislação portuguesa às relações laborais com os seus trabalhadores”. Heitor de Sousa diz que o Bloco quer concluir todas as audições necessárias em setembro, para que o plenário da Assembleia da República “se possa manifestar rapidamente” sobre a situação.
Nova greve europeia em setembro
A próxima semana vai ser sinónimo de dores de cabeça para a transportadora irlandesa. Na sexta-feira, dia 7, Roma será o palco para o anúncio de mais uma greve conjunta europeia. Os sindicatos que representam tripulantes e pilotos da Alemanha, Bélgica, Espanha, Holanda, Irlanda, Itália e Portugal vão reunir-se na capital italiana para definir os parâmetros de uma nova paralisação já neste mês de setembro. “O objetivo já está previamente delineado. A reunião serve para definirmos as questões estruturais. Os dias de greve já estão alinhavados. Contamos que sejam pelo menos dois dias, mas poderão ser mais”, garante o representante do SNPVAC.
Contrariamente aos protestos anteriores, em que tripulantes e pilotos fizeram greves em dias diferentes, desta vez a paralisação deverá ser simultânea. “Estamos a contar com que ambas as classes realizem esta luta. Todos têm os mesmos problemas”, diz Bruno Fialho. O SNPVAC prevê uma adesão ao protesto de 90% por parte dos tripulantes da Ryanair com base em Portugal. As condições salariais, o direito de usufruto de licenças de parentalidade, o fim dos processos disciplinares com base nas baixas médicas ou nos objetivos inerentes às vendas de bordo, são algumas das reivindicações sindicais. Alcançar um Acordo Coletivo de Trabalho (ACT) é também o objetivo da estrutura sindical, avança o advogado que representa o SNPVAC, Pedro da Quitéria Faria. “O que em Portugal os sindicatos querem é que haja um ACT entre a Ryanair, a Crewlink, a Workforce e o SNPVAC com regras iguais para todos os trabalhadores da Ryanair, e com respeito pela lei portuguesa. Esta é a nossa posição, sempre foi e a porta mantém-se aberta para que, caso assim pretendam, possamos celebrar este instrumento de regulamentação coletiva de trabalho”, conclui.
Acordos com pilotos europeus não são representativos
Ao longo das últimas semanas a transportadora anunciou ter chegado a pré-acordo com os sindicatos dos pilotos irlandeses e italianos. “Estes acordos revelam o progresso real que está a ser levado a cabo pela Ryanair nas negociações com os seus pilotos e respetivos sindicatos em vários mercados europeus”, referiu o ChiefPeopleOfficer da Ryanair, Eddie Wilson, em comunicado enviado à redações na semana passada.
Mas tanto as estruturas sindicais como o BE acusam a companhia de estar a levar a cabo uma “campanha de marketing”. Isto porque a ANPAC (Associação Italiana de Pilotos de Aviação), com quem a Ryanair chegou a um entendimento, tem apenas perto de 10 pilotos filiados e não é, segundo o SNPVAC, “uma estrutura representativa das centenas de pilotos que a Ryanair tem em Itália”. Já o pré-acordo com os pilotos irlandeses “é relativo a situações menores, porque a legislação irlandesa é cumprida pela Ryanair. Não estamos a falar como nos outros países, em que o que está em causa é a constituição e o código de trabalho. São situações diferentes”, acrescenta o sindicalista. Bruno Fialho acredita que “a Ryanair quer passar a imagem de que anda a negociar com os sindicatos, o que é totalmente errado”.
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