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News & MediaLatest NewsA (Não) Tributação da Alienação Onerosa de um Quinhão Hereditário

15 de Setembro, 2025

 

Uniformização de Jurisprudência – Acórdão do STA n.º 7/2025

 

Nos últimos anos, a temática da tributação dos ganhos obtidos através da alienação de quinhões hereditários tem suscitado intenso debate no panorama jurídico-tributário português.

Recentemente, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), datado de 29 de abril de 2025, que veio uniformizar a jurisprudência sobre o tema e clarificar a interpretação das normas fiscais aplicáveis, fez com que o tema ganhasse nova importância.

 

O que é um Quinhão Hereditário?

Para compreender o alcance desta decisão, importa, em primeiro lugar, definir o conceito de quinhão hereditário.

O falecimento de uma pessoa determina a transmissão do seu património para os herdeiros, que o recebem, de início, em indivisão. Ou seja, enquanto não for feita a partilha formal, os herdeiros não detêm a propriedade exclusiva sobre bens específicos; possuem, sim, uma quota-parte da universalidade dos bens que compõem a massa de herança – o quinhão hereditário.

O quinhão traduz-se, assim, num direito meramente abstrato, isto é, numa fração ideal do património da herança indivisa, que não corresponde à propriedade exclusiva de um bem concreto. Desta forma, os bens integrantes da herança apenas se tornam bens do herdeiro, confundindo-se com a sua esfera jurídica pessoal, após a adjudicação de bens específicos para preenchimento do seu quinhão.

 

O Entendimento Tradicional e a Posição da Autoridade Tributária (AT)

Anteriormente, a AT entendia que a venda de qualquer parte da herança, nomeadamente do quinhão hereditário composto por imóveis, deveria ser sujeita a tributação de mais-valias em sede de IRS, nos termos do artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do Código do IRS. Na perspetiva da AT, essa operação era tratada como uma alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis, ficando os herdeiros obrigados ao pagamento do imposto sobre eventuais ganhos daí resultantes.

Esta interpretação, contudo, foi motivo de múltiplos litígios, com contribuintes a alegar que estavam a ser “punidos” fiscalmente por cederem parcelas ideais de uma universalidade indivisa, quando na verdade não transmitiam direitos reais concretos sobre bens imóveis específicos. O entendimento da AT, influenciado pela leitura literal da norma, acabou por gerar incertezas legais e financeiros para os herdeiros.

 

A Decisão do STA e a Uniformização da Jurisprudência

O Acórdão 7/2025 do STA veio resolver esta querela, na medida em que foi decidido que a alienação do quinhão hereditário, mesmo que este quinhão compreenda bens imóveis, não constitui uma alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis e, consequentemente, os ganhos daí resultantes não são sujeitos a tributação em sede de IRS.

O STA clarificou que o que é transmitido na venda do quinhão não é a propriedade direta dos bens que compõem a herança, mas sim um direito abstrato e indeterminado sobre a universalidade do património hereditário, o que o exclui do âmbito de incidência tributária prevista para mais-valias imobiliárias.

Adicionalmente, o STA destacou que esta não tributação depende de prova inequívoca e formal – nomeadamente, deve constar claramente da escritura pública ou documento equivalente que a alienação abrange o direito integral ao quinhão hereditário, e não a venda de bens imóveis isolados da herança indivisa. Ao invés, se forem alienados bens concretos da herança, aí sim, estarão sujeitos a tributação.

 

Implicações Práticas e Relevância para os Herdeiros

1. Isenção Fiscal para Venda de Quinhão

A alienação do quinhão hereditário isoladamente não acarreta lugar a pagamento de IRS sobre mais-valias, o que representa uma significativa poupança para muitos herdeiros, especialmente em situações em que o património hereditário é composto maioritariamente por imóveis.

 

2. Cautelas Contratuais

Para garantir esta isenção, é crucial que os contratos e escrituras de compra e venda sejam redigidos de forma a deixar absolutamente claro que o objeto é o direito à herança (quinhão hereditário) e não bens específicos dentro da herança indivisa. A clareza documental é fundamental para evitar interpretações fiscais adversas.

 

3. Venda de Bens Específicos

Se um herdeiro alienar um bem específico já individualizado da herança, deverá pagar IRS sobre as mais-valias daí resultantes e, neste caso, serão aplicáveis as regras habituais.

 

4. Possibilidade de Reclamação e Revisão

Muitos contribuintes que pagaram IRS sobre a venda do quinhão hereditário, antes da uniformização da jurisprudência, poderão ter direito a reclamar o reembolso desse imposto junto da AT, com base na nova interpretação vinculativa do STA.

 

Perspetiva Fiscal: Oposição da Autoridade Tributária

Apesar da decisão do Supremo Tribunal Administrativo, a AT tem mostrado alguma resistência interna, tendo inclusive emitido informações vinculativas em sentido contrário, o que poderá originar conflitos futuros.

Assim, é recomendada muita atenção preventiva e acompanhamento especializado para defender os direitos dos contribuintes, nomeadamente no requerimento de revisões oficiosas ou processos judiciais, se necessário.

 

Planeamento Sucessório e Relevância Jurídica

Este entendimento também reforça a importância do planeamento sucessório e da adequada formalização da partilha de bens, para que a transmissão do património seja efetuada de forma segura e eficaz do ponto de vista fiscal e jurídico.

Além disso, a distinção clara entre a venda de quinhão hereditário e a alienação de bens específicos pode ser utilizada estrategicamente para otimizar os custos fiscais e garantir proteção jurídica aos herdeiros.

 

Conclusão

A uniformização jurisprudencial do STA constitui uma vantagem importante para os herdeiros que alienam quotas idealizadas de herança indivisa, afastando a tributação sobre as mais-valias em sede de IRS nestas situações.

A Área de Prática de Família, Sucessões e Empresas Familiares da Antas da Cunha Ecija já vinha a implementar este entendimento nas suas práticas de consultoria, orientando os procedimentos de alienação de quinhão hereditário no sentido de garantir a isenção prevista e a correta formalização documental necessária.
É, por isso, com particular satisfação que constatamos que a posição que vimos a adotar, ao longo dos últimos anos se encontra, finalmente, consolidada, acolhida de forma unânime e expressamente consagrada na mais recente jurisprudência dos tribunais.

Todavia, o acompanhamento criterioso e a devida conformidade documental assumem-se como elementos determinantes para assegurar o integral benefício desta isenção.

A equipa de Família, Sucessões e Empresas Familiares está disponível para prestar consultoria detalhada e acompanhamento personalizado, seja em matérias de planeamento sucessório, na gestão fiscal e patrimonial da herança, ou na defesa dos direitos dos herdeiros perante a Autoridade Tributária.

 

por Odete Sousa Pereira e Carolina Fonseca, Área de Prática – Família, Sucessões e Empresas Familiares

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