A indústria da moda, como sector criativo que é, permanece em constante evolução. As organizações que formam o ecossistema da moda, tendo em vista o aumento de receita, procuram consolidar-se no mercado, tornar-se mais competitivas e acompanhar as tendências, nomeadamente a transformação digital que avança em ritmo acelerado.
Neste enquadramento, entre investimentos e reestruturações, as operações de “fusão e aquisição” (comumente designadas operações de “M&A”) são instrumentos fulcrais, tendo como objeto (i) a fusão (“merger”) entre duas ou mais entidades para formar uma nova entidade ou (ii) a aquisição (“acquisition”) de uma ou mais sociedade(s), em ambos os casos impulsionando expansão ou consolidação de uma organização e, consequentemente, ao aumento da receita.
Atualmente, no sector da moda, assistimos a operações de fusão e aquisição em diversos campos, com especial foco na inovação e rentabilidade financeira:
- Fruto das exigências legais em matéria de ESG, as start-ups e PMEs tecnológicas e com práticas consolidadas de ESG, nomeadamente de sustentabilidade, tornaram-se alvos estratégicos para operações de fusão ou parcerias;
- O constante aumento da utilização de plataformas digitais, que levou ao crescimento exponencial do comércio eletrónico e do marketing digital, aumentou a atratividade das start-ups e PMEs do sector, sendo um alvo para futuras aquisições ou fusões por parte de grandes organizações;
- Procurando a redução de custos e aumento da eficiência, são várias as organizações que procedem à aquisição e/ou à fusão das entidades envolvidas na cadeia de produção, nomeadamente nas áreas de têxtil, logística e distribuição, procedendo, assim, à integração dos intermediários que compõem as várias fases da cadeia produtiva;
- Organizações com constrangimentos financeiros e pouca liquidez, são alvos de reestruturações por meio de processos de aquisição ou fusão noutras entidades.
Não obstante o leque de oportunidades, o sucesso destas operações exige uma abordagem jurídica capaz de antecipar riscos, proteger os ativos envolvidos e assegurar o cumprimento das normas legais e regulatórias aplicáveis.
Para o efeito, antes da conclusão de qualquer transação ou operação societária, é essencial realizar uma auditoria financeira e técnica, bem como identificar possíveis contingências de natureza legal, mediante auditoria jurídica (due diligence legal). A due diligence legal assume-se, assim, como uma ferramenta essencial para a identificação de riscos jurídicos e para a tomada de decisões informadas, mitigando riscos e conferindo segurança à operação. No setor da moda, essa análise deve incluir um exame aos seguintes aspetos, além de outros que se mostrem relevantes conforme as particularidades de cada caso:
- Modelos de Governance: análise da forma como é a organização gerida e controlada, como é o processo de tomada de tomada de decisões e quem tem o poder de indicar os membros que compõem os órgãos sociais e, assim, controlar a gestão da organização;
- Contratos: levantamento dos contratos principais, identificando cláusulas com obrigações ou limitações, nomeadamente em contratos comerciais, como sejam os de fornecimento, distribuição e de agência;
- Propriedade Intelectual: verificação da legitimidade das marcas, desenhos e direitos de autor, bem como a existência de litígios que possam comprometer a valorização da organização;
- Criminal, Contraordenacional e Compliance: aferição da existência de procedimentos criminais e contraordenacionais nos quais a organização seja parte e verificação do cumprimento das regras de Compliance, nomeadamente no que concerne ao combate do branqueamento de capitais;
- Temas laborais: análise de conformidade com a legislação laboral e de segurança no trabalho;
- ESG: avaliação do cumprimento das normas ESG, incluindo riscos de greenwashing e práticas laborais na cadeia de fornecimento;
- Concorrência: garantia de que a operação não infringe o direito da concorrência nacional ou europeu, que da mesma não resultam práticas restritivas da concorrência e concentrações que careçam de notificação às autoridades competentes;
- Financiamento: verificação do tipo e do montante dos financiamentos subscritos pela organização, bem como das restrições e contingências geradas pelos mesmos;
- Fiscalidade: análise das obrigações fiscais locais e possíveis contingências.
As operações de fusão e aquisição no setor da moda constituem uma via estratégica com elevado potencial de crescimento e inovação. No entanto, a sua concretização requer uma preparação jurídica, de carácter multidisciplinar, que assegure a mitigação de riscos e a conformidade com o enquadramento legal aplicável.
por Ricardo Cardoso e Carolina Ribeiro Santos, Área de Prática – Desporto, Moda e Entretenimento