Ao longo dos últimos anos, os países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), nos quais se inclui Portugal, têm vindo a reforçar as suas medidas de prevenção da corrupção e de promoção dos sistemas de integridade das instituições, públicas e privadas.
No relatório da OCDE sobre corrupção, denominado Anti-Corruption and Integrity Outlook 2024, divulgado no passado dia 26 de março de 2024, foi efetuada uma avaliação relativamente à (in)suficiência de algumas dessas medidas.
No que respeita concretamente a Portugal, a OCDE pronunciou-se, essencialmente, sobre os seguintes pontos:
- Quanto à estratégia de combate à corrupção, a OCDE concluiu que Portugal cumpre com os critérios relativos à qualidade do quadro estratégico e à implementação da estratégia.
Com efeito, Portugal adotou, em setembro de 2020, a Estratégia Nacional de Combate à Corrupção 2020-2024, com o objetivo de fortalecer e valorizar os mecanismos de prevenção e deteção da corrupção e crimes conexos.
Esta Estratégia identificou como prioridades, entre outras, (i) melhorar o conhecimento, a formação e as práticas institucionais em matéria de transparência e integridade, (ii) prevenir e detetar os riscos de corrupção no setor público, (iii) produzir e divulgar periodicamente informação fiável sobre o fenómeno da corrupção, e (iv) cooperar no plano internacional no combate à corrupção.
No entanto, a OCDE entendeu que, não obstante esta Estratégia compreenda indicadores de resultados para os objetivos de integridade pública, a mesma não só não estabelece valores-alvo para esses respetivos indicadores, como não inclui a identificação dos riscos de integridade pública existentes.
Mais acrescentando que, apesar de a Estratégia em questão ter em vigor um plano de ação disponível publicamente, que abrange objetivos com indicadores de resultados específicos, metas de base e uma lista de atividades, não existe qualquer relatório de acompanhamento do mesmo.
- No que concerne à matéria de gestão do risco de corrupção (controlo interno e auditoria), a OCDE considerou que não existem ainda definições estabelecidas de auditoria interna e de controlo interno aplicáveis a todas as instituições da administração pública.
E, por outro lado, que os regulamentos existentes, relativos à execução do controlo interno, não estabelecem as disposições operacionais e as responsabilidades relativas à gestão da auditoria interna.
- Ademais, a OCDE salientou o facto de Portugal não cumprir qualquer critério em matéria de regulamentação e práticas para atenuar os riscos de corrupção relacionados com as atividades de lobbying, que são essenciais para salvaguardar a transparência na elaboração de políticas públicas.
- No que respeita aos requisitos em matéria de conflito de interesses, a OCDE referiu que Portugal cumpre todos os critérios relativos à regulamentação, e que, em comparação com a média da OCDE, apresenta resultados positivos quanto à prática dos procedimentos neste domínio.
Neste âmbito, a OCDE considerou que os regulamentos estabelecem que os ministros, os deputados, todos os funcionários públicos, os juízes do Tribunal Constitucional e do Tribunal de Contas, o Provedor de Justiça e os membros dos Conselhos Superiores devem apresentar uma declaração de interesses.
Tendo concluído, que, pese embora 98% dos deputados tenham apresentado declarações de interesses nos últimos cinco anos, Portugal não regista a divulgação de interesses dos ministros, de determinados funcionários públicos que ocupam altos cargos do Estado, e de juízes que exercem funções nos tribunais superiores.
- Em matéria de financiamento político, a OCDE concluiu que, no que respeita aos critérios relativos à regulamentação e prática, Portugal apresenta resultados muito próximos dos valores das médias da OCDE.
Neste domínio, a OCDE referiu que, não obstante Portugal proibir as contribuições de Estados estrangeiros, empresas estrangeiras e empresas públicas, os donativos anónimos são permitidos até determinados limites.
A OCDE acrescentou que nos dois últimos ciclos eleitorais foram apresentadas por todos os partidos políticos contas referentes às eleições – o que foi feito dentro dos prazos definidos pela legislação nacional.
Concluiu, porém, que nos últimos cinco anos, nem todos os partidos políticos apresentaram contas anuais dentro dos prazos definidos pela legislação nacional.
- Por fim, em matéria de transparência da informação pública, a OCDE referiu que Portugal apresenta resultados positivos no que concerne aos critérios relativos à regulamentação e à prática.
Concretamente, a OCDE considerou que a regulamentação portuguesa estabelece as disposições necessárias relativamente à divulgação da informação pública.
No entanto, acabou por concluir que alguns dados continuam a não ser disponibilizados ao público, tais como as agendas das sessões governamentais, as agendas dos ministros, os dados agregados sobre pedidos de informação, e as declarações de bens e interesses dos ministros, deputados, funcionários públicos de dois escalões superiores do poder executivo e juízes dos tribunais superiores.
Face ao exposto, no entendimento da OCDE, a aplicação e o acompanhamento de medidas de promoção da integridade, por parte de Portugal, necessitam ainda de ser reforçados, de forma a atenuar os riscos de corrupção.
por Alexandra Mota Gomes e Anabela Franco, Área de Prática – Criminal, Contraordenacional e Compliance