A Lei n.º 99-A/2021, de 31 de dezembro, que procedeu à primeira alteração ao Estatuto da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas (EOROC), introduziu alterações significativas ao regime jurídico aplicável à certificação legal de contas, incluindo para representações permanentes de sociedades estrangeiras em Portugal, mais conhecidas como sucursais.
Estas mudanças surgem com a revogação do artigo 43.º do EOROC, que anteriormente impunha a designação de um Revisor Oficial de Contas (ROC) em várias entidades, incluindo sucursais, quando preenchidos os requisitos legais para o efeito.
Com efeito, a Lei n.º 140/2015, de 7 de setembro, que aprovou o atual EOROC, já havia estabelecido, no seu artigo 43.º, que todas as entidades se encontravam sujeitas à intervenção de ROC nos casos em que (a) tal resulte de disposição legal, estatutária ou contratual ou (b) possuam ou devam possuir contabilidade organizada nos termos do referencial contabilístico aplicável e preencham os requisitos estabelecidos no n.º 2 do artigo 262.º do CSC, nomeadamente, que ultrapassem dois dos seguintes limites durante dois anos consecutivos: (i) total do balanço superior a 1.500.000 euros; (ii) total das vendas líquidas e outros proveitos superior a 3.000.000 euros; e (iii) número médio de trabalhadores empregadores durante o exercício superior a 50.
Contudo, a Lei n.º 99-A/2021, de 31 de dezembro revogou o artigo 43.º do EOROC, levantando, consequentemente, a questão de saber se a obrigação de nomear um ROC, prevista no n.º 2 do artigo 262.º do Código das Sociedades Comerciais (CSC) para sociedades por quotas, se mantém aplicável às sucursais.
Em concreto, constituindo as sucursais meras representações permanentes de sociedades estrangeiras, sem personalidade jurídica própria, discutia-se a aplicabilidade do n.º 2 do artigo 262.º do CSC, em resultado da sua não integração no conceito de sociedade.
No entanto, o entendimento sobre esta matéria evoluiu, especialmente à luz do n.º 1 do artigo 4.º do CSC, que obriga a que as sucursais em Portugal cumpram também com as exigências decorrentes do Código do Registo Comercial (CRC).
Embora as sucursais não possuam personalidade jurídica, o CRC prevê, desde logo, no seu artigo 10.º, alínea d), a obrigatoriedade de as sucursais prestarem contas.
Neste contexto, o artigo 42.º do Código do Registo Comercial estabelece os documentos necessários para o registo da prestação de contas, incluindo, entre outros, a certificação legal de contas por um ROC.
Nestes termos, a prestação de contas da representação permanente em Portugal deverá incluir, obrigatoriamente, a certificação legal de contas.
Esta certificação é da competência exclusiva de um ROC, tal como definido no EOROC, pelo que toda a representação permanente (sucursal) em Portugal, encontra-se sujeita à intervenção de ROC.
A este respeito, sempre se refira que, caso os estatutos da sociedade representada não exijam a existência de um órgão de fiscalização (conselho fiscal ou fiscal único integrados por um ROC/SROC), é necessária a designação de um ROC ad hoc para proceder à revisão legal de contas.
Por fim, alerte-se para a existência de obrigações adicionais no âmbito da publicidade das contas da própria sociedade estrangeira e da respetiva sucursal em Portugal, resultante da legislação específica do respetivo setor de atividade, nomeadamente quanto a instituições de crédito e sociedades financeiras – cfr. Aviso do Banco de Portugal n.º 1/2019, de 22 de janeiro de 2019).
Em suma, as sucursais de empresas estrangeiras em Portugal devem assegurar a certificação legal das suas contas, que deve ser realizada por um ROC, cumprindo assim as exigências de registo estabelecidas pela legislação portuguesa e evitando potenciais sanções por incumprimento.
por Amílcar Silva e Margarida Asseiceira, Área de Prática – Direito Comercial e Societário