Apesar do título, escolhido pelo dramatismo que invoca, não pensamos que esteja de facto em causa a morte da Advocacia. Estará, isso sim, em causa, a desadequação progressiva dos serviços jurídicos como até agora têm sido prestados. Seria, contudo, um título bem menos sonante para expressar a mesma ideia.
Direito e tecnologia: apesar de serem duas áreas distintas, estão contiguamente interligadas. Em qualquer debate sobre o futuro das profissões jurídicas tem de haver uma consideração pelo papel da tecnologia. Por outro lado, também em qualquer discussão a respeito da tecnologia tem de ser considerado o respetivo impacto na estrutura legal em que opera.
Enquanto advogados, é com pesar que constatamos o facto de a Justiça Portuguesa ser considerada pela sociedade como um sistema moroso e com uma estrutura que não consegue atender às expectativas das demandas da Justiça dentro do ritmo necessário. Sistema do qual os escritórios de advogado, aqui se incluindo as sociedades e os advogados em prática isolada, são a espinha dorsal.
As ferramentas básicas de um escritório de advocacia moderno já não se podem limitar simplesmente ao “outlook”, ao “word” e à impressora. Uma organização moderna não pode ignorar o inevitável e inexorável avanço da tecnologia. Os escritórios de advocacia, inseridos numa área tipicamente mais clássica e na qual o progresso é lento e relutante, não se podem dar ao luxo de ignorar as ferramentas tecnológicas que vão surgindo e que permitem a otimização da prestação dos serviços.
Como ponto de partida para uma enumeração não-taxativa de algumasferramentas ao dispor, sendo certo que a sua implementação é hoje quase transversal a todos os escritórios de advocacia, referimos o software de faturação, que permite um mais ágil e efetivo controlo da faturação. As crescentes exigências legislativas e corporativas a nível de Compliance, tornam indispensáveis a emissão de fatura discriminada e relatório de horas a qualquer escritório que pretenda trabalhar com clientes institucionais tais como bancos, seguradoras ou multinacionais.
Um outro tipo de ferramentas, imprescindível para um controlo efetivo dos recursos humanos e para melhor compreender as métricas de que qualquer negócio necessita para crescer, são as de análise e tratamento de dados, sejam financeiros, de recursos humanos ou outros.
Por outro lado, o advogado tem de ser capaz de fazer mais e melhor. Assim, e dependendo da área de prática em que está inserido, e numa perspetiva de otimização de recursos, ao advogado moderno é exigida a monitorização de centenas ou até milhares de processos, assuntos, diligências e contratos, sendo uma mera agenda jurídica manifestamente insuficiente para esta monitorização em larga-escala. Para este fim, uma ferramenta muito útil ao advogado moderno será um software de gestão de documentação que permita o arquivamento de documentos e a gestão geral de cada cliente/matéria/área.
Também a integração de ferramentas mais robustas, como um ERP – Enterprise Resource Planning, permite toda a gestão do escritório/empresa numa só plataforma, englobando a faturação, gestão de documentação, gestão de calendário de equipa entre outros.
Ainda uma outra ferramenta de grande utilidade para as profissões legais é o CLM – Contract Lifecyle Management. Com a crescente sofisticação dos contratos e das exigências de Compliance, esta ferramenta permite a monitorização de cada contrato, não apenas numa perspetiva de contabilização de prazos para renovação, cessação ou denúncia, mas também para a monitorização de cláusulas penais, níveis de serviço e utilização efetiva dos serviços contratados. Este controlo poderá, de facto, criar valor para o cliente e facultar métricas que permitem uma melhor (re)negociação dos contratos futuros.
A adaptação da advocacia à tecnologia não se deverá bastar com a adoção destas ferramentas, enumeradas unicamente a título de exemplo. É necessário estabelecer parcerias estratégias (sempre, claro, nos limites impostos pelo Estatuto da Ordem dos Advogados) com entidades que forneçam serviços de cibersegurança, proteção de dados, análise e tratamento de dados, entre outras. O posicionamento dos escritórios de advogados nestas parcerias permite que estejam na vanguarda da modernização da Justiça Portuguesa.
Numa última nota, é com otimismo que o Autor encara a expectável alteração do panorama da prestação de serviços jurídicos no mercado nacional com a introdução das sociedades multidisciplinares. Trata-se de uma mudança que permitirá o aumento/sofisticação dos serviços prestados, desde que sempre em cumprimento das regras deontológicas aplicáveis. É, no fundo, o desfecho do nosso título: evoluir ou morrer.
por Paulo Morgado e António Conde Lencastre, Área de Prática – TMT | Technology Transactions